Mais da metade da população mundial – 4,4 bilhões de pessoas – pode estar consumindo água contaminada, afirma um novo estudo que analisa a situação em países de renda baixa e média.
Isso significa que os números podem ser ainda maiores se forem considerados dados de países de renda mais alta.
Ainda assim, os dados são mais do que o dobro das estimativas de 2022 feitas pela Organização Mundial da Saúde (OMS), e representam dois terços das pessoas que vivem em países de renda baixa e média.
Para ser considerada "gerenciada com segurança", a água deve estar disponível através de instalações livres de contaminação e projetadas para fornecer água de maneira segura.
A maioria dos que não possuem acesso a esses serviços correm risco de contaminação fecal na água, segundo pesquisa, que foi publicada no jornal científico Science .
“A informação que apontamos para altos índices de contaminação”, disse a pesquisadora-chefe Esther Greenwood, da ETH Zurique.
A ingestão de água contaminada pode causar uma série de doenças, como cólera, disenteria, febre tifoide e doenças menos graves como o norovírus.
Dados de satélites e pesquisas domiciliares
Observações através de satélite e informações de pesquisas realizadas em residências foram combinadas e descobertas com a ajuda da inteligência artificial para definir áreas de acesso seguro ou inseguro à água.
Greenwood explica que as conclusões ainda são conservadoras, uma vez que os dados são amostras colhidas em um único dia, ao invés de em escalas de tempo mais prolongadas. “É possível que os números sejam ainda maiores”, afirmou.
Sul Asiático e a África Subsaariana são as regiões mais afetadas
O estudo avalia os impactos humanos e ambientais que limitam o acesso à água potável segura ao longo das 22 sub-regiões geográficas da ONU.
A conclusão é de que 1,2 fração de pessoas no Afeganistão, Bangladesh, Butão, Irã, Maldivas, Nepal, Paquistão e Sri Lanka – mais da metade da população naquela região – não tem esse acesso garantido.
O Sul Asiático, no entanto, ainda está em melhor situação se considerados índices per capita.
Na África Subsaariana – uma região com mais de 1,1 bilhão de pessoas –, o acesso precário à água é uma realidade de mais de 80% da população.
Também na Oceania, excluindo a Austrália e a Nova Zelândia, 75% das pessoas são afetadas pelo problema.
Preocupações além da E. coli
A pesquisa se baseou na análise dos níveis da bactéria E. coli como indicativo de contaminação.
A E. coli está associada a doenças que causam diarreia e que com frequência resultam da exposição a alimentos e água contaminados. Enquanto adultos saudáveis tendem a ter sintomas leves e se recuperam rapidamente, crianças e idosos correm o risco de desenvolver falência renal e até morrer.
A bactéria está por trás de um surto recente de norovírus na Itália, e também adoeceu diversas atletas que nadaram no rio Sena durante os Jogos Olímpicos de Paris.
"Não estamos diretamente envolvidos na E. coli, já que não suspeitamos que sejam todas patogênicas", informou Greenwood. "É, na verdade, um indicador de que pode ter contaminação fecal recente. Isso nos preocupa porque nas fezes há um alto risco de propagação de outros patógenos."
A E. coli, porém, não é a única preocupação. Embora não façam parte deste estudo, os níveis de arsênio e fluoreto também são um indicativo de contaminação química da água. As duas substâncias, embora presentes na natureza, podem ser tóxicas se consumidas em excesso.
Um estudo de 2023 estimou que cerca de 100 países foram afetados por contaminação por flúor (excedendo 1,5 mg/L) nas águas subterrâneas.
Os mesmos pesquisadores descobriram que 230 milhões de pessoas – a maioria na Ásia – estavam ameaçadas pelos riscos de contaminação de arsênio nas reservas subterrâneas de água.
Embora essa contaminação possa ocorrer naturalmente – mais de 80% da contaminação de águas subterrâneas por flúor e arsênio é atribuída a processos geológicos –, o uso industrial de produtos químicos e a queima de carvão também podem contribuir para o processo.
“Parece que há mais residências afetadas pela contaminação de E. coli do que pela contaminação química”, diz Greenwood. "Acho, no entanto, que a contaminação química traz implicações diferentes para a saúde das pessoas. Isso é algo que ainda precisa ser pesquisado mais a fundo."
Uma em cada duas pessoas suspeita da própria água
O acesso à água potável depende tanto da situação geográfica, sociocultural e econômica local quanto do país em que se vive.
Pessoas em áreas rurais mais pobres enfrentam frequentemente maiores dificuldades para acesso à água limpa. Segundo estimativas da OMS de 2022, quase 500 milhões de pessoas pelo mundo coletaram água de poços desprotegidos, rios, lagoas e lagos.
Mas também aqueles que vivem em cidades de baixa renda, ou em assentamentos informais ou ilegais, têm pior acesso a fontes de água potável.
A confiança na segurança da água é bastante baixa em termos globais, com um estudo de 2019 da Lloyd's Register Foundation mostrando que uma em cada duas pessoas desconfia que sua fonte de água potável possa causar graves danos se consumida diretamente.
"Não basta ter água fluindo nas torneiras. As pessoas precisam confiar em sua água", frisou Sera Young, antropóloga da Midwestern University, Illinois, EUA, e líder do estudo.
Investir em infraestrutura é apenas parte do caminho para a melhoria da qualidade da água. Young defende a realização de testes frequentes para ajudar as pessoas a confiarem no seu abastecimento de água.
Isso pressupõe a publicação dos testes em linguagem acessível, defende um pesquisadora, "e até mesmo colocar testes nas mãos das pessoas" para que elas próprias possam monitorar a qualidade da água por conta própria.
*Via DW
Nossas notícias em primeira mão para você! Link do grupo MIDIA HOJE: WHATSAPP