Se considerarmos todas as eleições depois da redemocratização, 1986-2022, o pêndulo da política brasileira esteve pelo menos sete dos nove mandatos sob o controle dos partidos de centro-esquerda. Tivemos nove presidentes nesse período: Tancredo Neves/José Sarney (MDB); Fernando Collor e Itamar Franco (PRN); Fernando Henrique Cardoso (FHC) em dois mandatos (PSDB); Lula em dois mandatos (PT); Dilma Roussef em dois mandatos (PT); Michel Temer (MDB); e, por último, Jair Bolsonaro (PSL/PL).
Tentando classificar a matriz ideológica dos eleitos e seus partidos, somente dois desses presidentes foram do campo político da direita ou da extrema direita: Collor, que sofreu impeachment, e Bolsonaro. Em síntese: em 28 dos 36 anos da Nova República o país foi governado pela centro-esquerda/esquerda.
Lula concorreu em seis disputas dessas nove eleições para presidente, tendo perdido as três primeiras: 1990, com Collor, e posteriormente as de 1994 e 1998 contra FHC.
Na sequência, o petista venceu três eleições, em 2002, 2006 e, agora, 2022. Sem considerarmos que Lula participou diretamente das eleições de Dilma, elegendo-a e a reelegendo como sua sucessora.
Estamos, portanto, falando de um dos maiores ícones populares da História política recente da República brasileira.
A História reconhecerá isso no futuro, gostemos ou não.
Em todas as eleições em que o PT venceu para presidente, os estados do Norte e Nordeste foram o fiel da balança, e Bolsonaro sabia disso.
Pouco podia fazer, pois havia um pertencimento regional representado por Lula devido às políticas de transferência de renda e ao simbolismo de “pai dos pobres” muito consolidado no imaginário popular da região nordestina e até do País.
O lulismo no Brasil é fenômeno político muito maior que o próprio petismo e precisamos tentar decifra-lo.
Prova disso é que o PT elegeu apenas quatro governadores nestas eleições, em pequenos estados do Nordeste. Elegeu somente quatro senadores novos, que somados com os quatro antigos formarão uma bancada partidária que representa algo em torno de 10% dos assentos do Senado e aproximadamente 14% das cadeiras da Câmara dos Deputados, com 69 eleitos.
Observando mais de perto o desempenho desse fenômeno Lula ao longo de sua trajetória, essa vitória atual bastante previsível, como veremos abaixo.
A performance de Lula, PT, nas duas eleições que venceu, eleição-reeleição, registrou os dois maiores índices alcançados num segundo turno desde que que a reeleição foi instituída: em 2002 com 61,27% e em 2006 com 60,83%. Neste pleito de 2022, alcançou 50,90%.i
Cabe agora aos derrotados bolsonaristas devolverem a gentileza aos vitoriosos desse pleito por respeito à vontade da maioria do povo brasileiro.
Há que se considerar que em 2018, quando foi retirado da disputa à Presidência e preso, o petista, segundo as pesquisas eleitorais da época, tinha 39% das intenções de votos contra 19% de Bolsonaro.
Ontem, Lula venceu interrompendo uma reeleição quase que “natural” de Bolsonaro, mesmo estando distante do mundo do poder há pelo menos 7 anos.
Bolsonaro acabou entrando para história como o único presidente que não conseguiu se reeleger desde que se implantou a reeleição, em 1997.
Além de Lula, apenas um ex-presidente, voltou ao poder depois de ter sido Presidente da República que foi Getúlio Vargas.
Com uma diferença essencial: Lula ascendeu aos três mandatos pelo voto popular, enquanto Vargas em duas vezes foi por golpes militares.
Talvez olhando de cima, sobre nosso passado, enxerguemos alguns marcos políticos reveladores necessários para entender um pouco mais desse movimento pendular da política no Brasil que resultou na eleição de Lula presidente. Ver para além dos ânimos exaltados do imediatismo.
Nesta eleição, ao contrário das demais em que os adversários estavam no campo da centro-esquerda (PSDB e PT), o centro democrático desapareceu com o PSDB, emergindo uma nova força política, mais identificada com a extrema-direita, com bandeiras e agendas muito claras.
Esse movimento heterogêneo de direita, conservador ou liberal veio para ficar, pois que seja assim.
O contraditório sempre será necessário à civilização e à democracia, desde que os limites dessas disputas sejam o respeito a liberdade de opinião, a imprensa livre, os direitos humanos, o voto soberano e a harmonia entre os poderes.
Anos atrás, os petistas engoliram o choro pelo impeachment de Dilma, pela prisão de Lula e pela derrota de Haddad aceitando a eleição legítima de Bolsonaro.
Lamberam suas feridas e fizeram suas autocríticas interna e voltaram pelo voto poder do país.
Cabe agora aos derrotados bolsonaristas devolverem a gentileza aos vitoriosos desse pleito por respeito à vontade da maioria do povo brasileiro.
Pois como disse o chanceler britânico e grande general da Segunda Guerra Mundial Winston Churchil, “a democracia é a pior forma de governo, com exceção de todas as demais”.
*Suelme Fernandes é político e Historiador
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