Desde a decisão de que a Copa do Mundo seria sediada no Catar, algumas críticas aconteceram. A principal delas se deu quanto aos direitos humanos. Como tratar da interseccionalidade, se várias situações que envolvem os direitos humanos não são reconhecidas por lá?
Algo de cabalístico estaria a ocorrer com a 22ª Copa do Mundo no ano de 2.022.
Para começar, as outras copas aconteceram no mês de junho e julho, tradicionalmente. No Catar, por conta do clima em meados do ano, em que a temperatura chega a 50º Celsius, convencionou-se que a festividade ocorreria no mês de novembro para “fugir” da situação “escaldante”. Quisera tudo se resumisse ao clima.
O respeito ao segmento LGBTQIA+, às mulheres, aos trabalhadores migrantes, aos jornalistas, passou a ser a pauta principal.
Países a sediar mundiais como esse se obrigam, também, a respeitar a cultura dos demais. Todavia, o Catar é um dos 70 países
do mundo onde as relações sexuais entre pessoas do mesmo sexo são criminalizadas, de acordo com a organização da Anistia Internacional. Logo, como lidar com isso?
Para se insurgir contra a discriminação que criminaliza a comunidade LGBTQIA+, alguns países adotaram o uso da braçadeira “one love”, com o entendimento de que o futebol conecta, onde há o desenho do arco-íris em forma de coração.
Contudo, houve proibição pela Fifa com a ameaça de cartão para a respectiva transgressão. Não estavam dispostos a serem tolerantes com mensagens de tolerância.
Quanto às mulheres, mesmo em clima desértico, as vestimentas para as visitantes deveria ser calça mais larguinha e blusa leve sem decotes. Levar consigo um lenço para cobrir os cabelos em locais onde é obrigatório o uso do adereço, se tornou imposição. Sapatos devem ser de saltos baixos e o mais fechado possível.
Em entrevista para uma emissora de TV de canal aberto do Brasil, uma jornalista narrou que usava uma sandália aberta, e percebeu os olhares de reprovação para os pés.
De outro lado, um dos dirigentes da Copa do Mundo do Catar, Hassan Al Thawadi, admitiu a morte de 400 a 500 trabalhadores migrantes durante os preparativos. O jornal britânico The Guardian afirmou ter realizado investigação que apurou a morte
de aproximadamente 6.500 pessoas que trabalharam para o acontecimento.
O grupo de direitos humanos Equidem divulgou relatório no início de novembro informando violações persistentes e generalizadas aos direitos trabalhistas das pessoas que trabalharam na construção dos estádios.
Não é de hoje que o esporte é a redenção para a sociedade brasileira. Ícones, e mais que isso, heróis, são criados e colocados em pedestais, tamanha expectativa depositada.
Está o esporte diametralmente ligado a altos rendimentos financeiros, bem como ao lazer e grande divulgação da mídia. Muitas pessoas em vulnerabilidade social buscam a inclusão no esporte, inclusive, para proporcionar oportunidade para todos e todas.
A cultura sempre é associada ao esporte, sendo essencial para aquela parcela da sociedade que não possui acesso a lugares e serviços básicos necessários para a efetivação da dignidade humana.
Émile Durkheim dizia ser a consciência da coletividade capaz de coagir pessoas a agirem de acordo com regras morais dominantes. Assim, o esporte desempenha o papel de fazer elevar a moral social. E não é à toa que jovens com propensão à marginalidade são encaminhados para a prática esportiva, se concretizando em mecanismo de contenção de prática criminosa. Contudo, conforme Bourdieu, a economia simbólica do esporte no mundo social reforça o objeto de dominação.
Voltando à copa, levando-se em consideração que a justiça social só é possível na democracia, se o objetivo for alcançar cem por cento das pessoas, indistintamente, o que dizer dos episódios vistos, ouvidos e narrados no maior espetáculo da terra?
Infelizmente, a evolução da humanidade ainda precisa de maior velocidade para que se possa creditar a ela, humanidade, um mundo melhor.
É por aí...
*Gonçalo Antunes de Barros Neto é formado em Direito e Filosofia e escreve aos domingos em A Gazeta (e-mail: [email protected]).
*Os artigos são de responsabilidade seus autores e não representam a opinião do Mídia Hoje.
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