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geral Terça-feira, 18 de Junho de 2024, 16:51 - A | A

Terça-feira, 18 de Junho de 2024, 16h:51 - A | A

AGORA SÃO RÉUS

Supremo torna réus acusados de mandar matar Marielle

Redação

 

(Imagem: Mario Agra/Câmara dos Deputados/Reprodução/TV Globo/Fernando Frazão/Agência Brasil)

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Chiquinho Brazão, Domingos Brazão e Rivaldo Barbosa foram denunciados pela morte de Marielle Franco.

 

 

Nesta terça-feira, 18, de forma unânime, a 1ª turma do STF tornou réus por encomendarem a morte de Marielle Franco e de seu motorista, Anderson Gomes, o deputado Federal Chiquinho Brazão, seu irmão, Domingos Brazão, conselheiro no Tribunal de Contas do RJ, e o ex-chefe da Polícia Civil do Rio, Rivaldo Barbosa.

 

Os três foram presos em março, preventivamente, com autorização do ministro Alexandre de Moraes na Operação Murder, Inc., deflagrada pela PGR, pelo MP/RJ e pela PF. 

 

O voto pelo recebimento da denúncia de Alexandre de Moraes foi seguido pelos ministros Flávio Dino, Luiz Fux, Cristiano Zanin e ministra Cármen Lúcia.

 

Quem são

 

Os irmãos Brazão são figuras políticas de longa data no Rio de Janeiro. Chiquinho Brazão foi vereador por quatro mandatos e serviu ao lado de Marielle Franco até sua morte em 2018. Ele foi eleito deputado Federal em 2022, mas se licenciou para ser secretário municipal de ação comunitária, cargo que ocupou brevemente até fevereiro. Sua citação levou o caso para a Suprema Corte.

 

Domingos Brazão entrou no Tribunal de Contas do Estado em 2015, após ser deputado estadual desde 1999.

 

Rivaldo Barbosa, delegado, tornou-se chefe da Polícia Civil do Rio em março de 2018, indicado pelo interventor federal Walter Braga Netto. Liderou a investigação da morte de Marielle e prometeu resolver o caso à família. Deixou o cargo em janeiro de 2019 após a posse de Wilson Witzel. Em delação, Ronnie Lessa indicou que os mandantes da execução fazem parte de um grupo político poderoso no Rio.

 

Denúncia

 

O procurador-geral da República, Luis Augusto Santos Lima, em sustentação oral, afirmou que Domingos e Chiquinho Brazão formaram alianças com milícias no Rio de Janeiro desde 2000, em Jacarepaguá, Rio das Pedras e Osvaldo Cruz, para promover a exploração irregular do mercado imobiliário por meio de grilagem. A atuação das milícias envolve ocupação territorial permanente com violência, sob o pretexto de prestação de serviços básicos à população local, favorecendo, assim, o modelo de negócios dos irmãos Brazão e permitindo a construção de redutos eleitorais nas áreas controladas.

 

Segundo o MP, Domingos e Chiquinho mantêm relação dinâmica com as milícias, permitindo que apenas candidatos apoiados por esses grupos possam realizar atos de campanha. Em troca, os eleitos devem defender os interesses dos milicianos perante o Estado.

 

Operação Intocáveis e milícias locais

 

O procurador afirmou que major Ronald, então oficial da PM, uniu-se a Laerte Silva de Lima e Marcos Vinicius Reis dos Santos (Fininho) para constituir uma milícia local, revelada pela Operação Intocáveis. Os três foram denunciados, processados e condenados.

 

Laerte e Ronald apoiaram as campanhas dos irmãos Brazão em 2010, 2012 e 2014, garantindo-lhes os votos da região com o apoio da milícia. Outros candidatos não recebiam o mesmo tratamento, e alguns, como o vereador Nandinho, de Rio das Pedras, foram assassinados.

 

Nomeações e contatos com milicianos

 

Ainda, na sustentação oral, o procurador informou que os irmãos Brazão beneficiaram milicianos de várias formas. Fininho recebeu cotas de nomeação para cargos públicos controlados formal e informalmente por Domingos, incluindo a mãe de seu filho em cargos de comissão na ALERJ. Relatórios de investigação comprovam a relação entre os irmãos e os milicianos, com extratos de ligação telefônica mostrando contatos frequentes entre Domingos e Fininho.

 

Expansão e controle territorial

 

O procurador afirmou que além de Rio das Pedras, os irmãos Brazão controlavam loteamentos ilícitos principalmente em Jacarepaguá, com auxílio de Robson Calixto Fonseca, o Peixe. Robson, assessor de Domingos na ALERJ e no TCE, atuava como interlocutor frequente dos irmãos e milicianos de Rio das Pedras, especialmente com Fininho.

 

Desde 2018, Robson participava ativamente de atividades de milícia na Taquara, região de Jacarepaguá. Inicialmente, a investigação contava apenas com denúncias anônimas de extorsões, mas isso foi confirmado por documentos da CPI das Milícias.

 

Negócios ilícitos e grilagem

 

Documentos apreendidos pela PF comprovam que Robson mantinha negócios ilícitos na região e acessava servidores da prefeitura do Rio de Janeiro para tentar regularizar terras invadidas, utilizando dados restritos da prefeitura. Robson geria pessoalmente negócios imobiliários irregulares no interesse da milícia e sob orientação dos irmãos Brazão. Ele direcionava pagamentos a construtores e loteadores, usando intermediários para ocultar a origem real dos recursos (laranjas). Informações da polícia judiciária confirmam os fortes vínculos dos irmãos Brazão com Robson, Fininho, major Ronald e Laerte.

 

As grilagens promovidas pelos denunciados envolviam a invasão e ocupação de terras por pessoas de baixa renda, seguida pela reivindicação de posse e propriedade para conferir uma função social aparente à posse.

 

Inicialmente, as ocupações permaneciam ocultas, mas após a regularização, a posse ou propriedade era adquirida por meio de intermediários ou laranjas. A denúncia detalha transações imobiliárias com esse modus operandi.

 

Redutos eleitorais e conflitos políticos

 

Em Osvaldo Cruz, os irmãos Brazão tinham alianças com Edmilson da Silva Oliveira, conhecido como Macalé. A relação entre eles é antiga, conforme o relatório final da CPI das Milícias de 2018, que evidenciava um reduto eleitoral na localidade.

 

Durante seu mandato parlamentar, Chiquinho Brazão propôs e impulsionou projetos de lei para facilitar a regularização e o uso do solo, especialmente em áreas de milícia e loteamentos clandestinos, no interesse da organização criminosa.

 

Em 2015, como vereador, articulou a aprovação das LC municipais 60 e 161, que visavam flexibilizar  requisitos para regularização de parcelamentos irregulares do solo, beneficiando grileiros em Vargem Grande, Jacarepaguá e Taquara, redutos eleitorais dos Brazão tomados por milicianos.

 

Dificuldades e novas propostas

 

Apesar das leis, a regularização não ocorreu conforme esperado. Segundo o MP/RJ, em 2018, 186 projetos de regularização foram apresentados com base na legislação, mas nenhum foi deferido, mesmo após mais de dois anos de vigência das leis.

 

Para contornar as dificuldades, Chiquinho propôs a LC 174, que visava flexibilizar ainda mais as exigências ambientais e urbanísticas para o uso e ocupação do solo e a legalização de edificações.

 

Em relação à legislação existente, essa nova lei expandia consideravelmente a área de construções ilegais passíveis de regularização, permitindo a regularização de parcelamentos sem edificações, medida incompatível com a proposta de regularização fundiária voltada para políticas sociais de habitação.

 

Contudo, a proposta encontrou resistência política, especialmente do PSOL e de Marielle Franco. A vereadora defendia que as propostas de regularização deveriam atender aos segmentos sociais de menor renda. 

 

Planejamento e execução do assassinato de Marielle 

 

A denúncia aponta que, para superar a resistência, os irmãos Brazão infiltraram Laerte Silva de Lima no PSOL, em 2017, para coletar informações a respeito das atividades políticas do partido e de seus integrantes. Marielle, cuja bandeira política incluía a regularização do uso do solo voltada para habitação social, passou a defender abertamente que os projetos de lei dos Brazão visavam explorar economicamente áreas dominadas por milícias.

 

Entre a apresentação do projeto de lei em 2016 e sua aprovação em 2017, as deliberações parlamentares foram adiadas nove vezes, evidenciando a resistência e as dificuldades enfrentadas para a aprovação. Apesar da vitória legislativa, Laerte monitorou as atividades partidárias de Marielle e informou Domingos que ela convocou reuniões comunitárias em Jacarepaguá, interferindo nos negócios dos irmãos.

 

Eliminar Marielle significava remover um obstáculo e dissuadir outros de continuar a oposição, afirmou o procurador. No segundo semestre de 2017, os irmãos Brazão determinaram a Edmilson Oliveira (Macalé) que preparasse a execução de Marielle, oferecendo-lhe recompensas em loteamentos e áreas de milícia.

 

Para garantir a impunidade, os mandantes informaram previamente o delegado de polícia Rivaldo Barbosa sobre o plano, ajustando medidas para inviabilizar futuras investigações. Rivaldo recebia pagamentos mensais de milicianos e contraventores para frustrar investigações de homicídios e orientou que não executassem Marielle quando ela estivesse indo ou voltando da Câmara. Rivaldo ocupava a função de diretor da divisão de homicídios da PC do RJ e, no dia anterior ao crime, foi empossado chefe da Polícia Civil do Estado, garantindo a impunidade essencial para os mandantes.

 

O procurador afirmou que, para a execução, os irmãos determinaram que Macalé contratasse Ronnie Lessa, o qual não possuía antecedentes criminais antes da morte de Marielle.

 

Então, Macalé apresentou o plano e propôs sociedade na área de milícia, a qual foi aceita por Ronnie. Além disso, major Ronald aceitou a incumbência de vigiar a rotina de Marielle e coletar informações úteis para a execução do crime.

 

Em 6 de março, uma semana antes do delito, Ronald acompanhou um deslocamento da vítima em agenda na Universidade Candido Mendes. Monitorando redes sociais, constatou que no dia 14 de março Marielle compareceria à Casa das Pretas para um evento. Essa circunstância foi a janela de oportunidade para a execução do homicídio.

 

Delação e evidências

 

Segundo a procuradoria, portanto, há justa causa para o recebimento da denúncia, pois os autos versam sobre a atuação de uma organização criminosa hierarquicamente estruturada, com clara divisão de tarefas, na qual os irmãos Brazão ocupam os escalões superiores. Portanto, segundo o MPF, existem indícios evidentes de autoria.

 

Chiquinho Brazão, Domingos Brazão e Rivaldo Barbosa foram denunciados pela morte de Marielle Franco.(Imagem: Mario Agra/Câmara dos Deputados/Reprodução/TV Globo/Fernando Frazão/Agência Brasil)
Defesa de Rivaldo

 

O advogado do ex-delegado Rivaldo Júnior, Marcelo Ferreira de Souza, argumentou que Rivaldo não foi alçado à chefia de polícia para proteger a milícia. Ele foi nomeado durante o governo Michel Temer, no contexto da intervenção Federal no Rio de Janeiro, sem interferência de políticos locais ou autoridades estaduais. Além disso, afirmou o causídico, o chefe de polícia não conduz investigações diretamente.

 

Marcelo Souza sustentou que a alegação de recebimentos mensais é falsa e que a denúncia se baseia unicamente no depoimento de um delator. Ademais, que uma "devassa" foi feita nas contas de Rivaldo e de sua família, e não há provas de recebimento de valores ilícitos. Ele afirmou que não há qualquer conduta ilícita por parte de Rivaldo, e que aceitar a denúncia seria colocar toda a polícia do Rio de Janeiro no banco dos réus.

 

O advogado também afirmou que houve uma falha grave nas investigações quando investigadores Federais aceitaram como verdadeiro um dossiê comprado pelo ex-vereador do RJ, Marcelo Siciliano. Siciliano teria contratado dois policiais civis expulsos da corporação para incriminar os irmãos Brazão. Esses policiais incluíam Marinho e Aluísio Russo, que tinham parentes na polícia. Em depoimento, Marinho declarou que teve colaboração direta de três pessoas na elaboração do dossiê: um delegado Federal, um jornalista e um policial civil.

 

Como ninguém dava crédito ao dossiê, trouxeram o delegado Fabrizio José Romano para dar credibilidade ao documento. Ademais, afirmou que Ronnie Lessa conduziu a polícia Federal como boiadeiro conduz a boiada, dizendo o que ela queria ouvir, já que ele sabia do dossiê.

 

Defesa de Chiquinho Brazão

 

O advogado de defesa de Chiquinho Brazão, Cléber Lopes de Oliveira, comparou o caso ao famoso erro judiciário dos irmãos Naves em Araguari, ajustando para a situação atual, ressaltando que não há um "Benedito" aparecendo após tudo o que ocorreu.

 

Ele afirmou que não havia qualquer animosidade entre Marielle Franco e Chiquinho Brazão, refutando a alegação de que Marielle tinha como bandeira política o tema imobiliário. Segundo Cléber, Marielle apresentou apenas um projeto em 2017, que reproduzia uma política pública Federal, sem se opor aos projetos anteriores.

 

O advogado destacou que os projetos de lei 160 e 161 foram apresentados em 2015, antes de Marielle ser vereadora, e que eram de iniciativa do Executivo municipal. O PL 174, que apenas prorrogava o prazo para adesão das famílias a um programa anterior, foi apresentado em 2016, também antes de Marielle assumir seu mandato. 

 

Sobre a acusação de que Chiquinho Brazão teria infiltrado um agente no PSOL após as eleições de 2016, o advogado argumentou que seria impossível, já que não havia como prever o comportamento de Marielle. Ele também afirmou que essa informação não foi confirmada pela Polícia Federal.

 

Defesa de major Ronald

 

O advogado Igor Luiz Batista de Carvalho, atuante na defesa do major Ronald, afirmou que no processo se defendem espectros e fantasmas. Ele destacou que os dados de geolocalização de Ronald provam que ele não estava monitorando Marielle Franco. Além disso, ressaltou a ausência de indiciamento tanto pela Polícia Civil quanto pelo MP/RJ.

 

Defesa de Domingos Brazão

 

O advogado de Domingos Brazão, Roberto Brzezinski Neto, argumentou que haveria incompetência da Corte para julgar o caso. Ele destacou que o homicídio ocorreu em março de 2018, enquanto Chiquinho Brazão assumiu o mandato parlamentar em 2019, não havendo liame entre os eventos. O causídico também solicitou que o caso fosse desmembrado em relação àqueles que não possuem foro por prerrogativa de função.

 

Ele alegou que a defesa não teve acesso a todos os elementos da delação de Élcio Queiroz, pedido que foi indeferido, e pediu a conversão do feito em diligência para que a defesa possa ter acesso à delação de um corréu.

 

O advogado afirmou que não há provas dos encontros narrados por Ronnie Lessa, nem da entrega e devolução da arma. Ele questionou a credibilidade do relato, sugerindo que um sicário profissional não pediria a arma para o mandante e aceitaria a devolução, correndo o risco de ser descoberto.

 

Sobre os loteamentos, Roberto Brzezinski Neto mencionou que a Polícia Federal não encontrou evidências concretas de projeto ou planejamento de ação de ocupação.

 

Ao final, afirmou que a defesa enfrenta dificuldades para acessar a penitenciária de segurança máxima em Porto Velho. Pediu que a Corte reconhecesse a prerrogativa funcional de Domingos, como integrante do TCE, de ser recolhido em cela especial ou sala de Estado Maior, em conformidade com o art. 33, III, da lei da Magistratura.

 

Voto do relator

 

Em seu voto, que foi seguido por todos os pares, ministro Alexandre de Moraes, relator da ação, afirmou que a alegação de incompetência do STF para julgar a ação não procede, com base no art. 53, §1º, e no art. 102, I, b da CF.

 

S. Exa. explicou que a análise deve ser feita a partir da imputação da procuradoria, que envolve organização criminosa, a qual não terminou antes da diplomação de um dos denunciados.

 

A natureza permanente do crime justifica que a competência se mantenha no STF, além da conexão com a obstrução de investigação envolvendo a organização criminosa. Ambas as questões estão relacionadas ao mandato de deputado, pois a obstrução requer poder de influência. Além disso, esse tema já foi tratado e referendado por unanimidade pela turma no momento da prisão.

 

A alegação de que crimes dolosos contra a vida não poderiam ser julgados no STF, devido à competência do tribunal do Júri, também foi rejeitada. O ministro afirmou que está pacificado que autoridades com prerrogativa de foro mantêm esse direito inclusive para esses crimes.

 

Moraes também afastou o desmembramento do processo, conforme a súmula 704 do STF, e rejeitou o impedimento e suspeição do ministro Flávio Dino, argumentando que o fato de Dino exercer o cargo de ministro da Justiça na época do reinício das investigações pela PF não configura hipótese de impedimento prevista no CPP. 

 

Além disso, afastou a alegação de cerceamento de defesa, afirmando que possui todas as certidões de todos os acessos das defesas às provas. Ademais, afirmou que estão previstos todos os requisitos do art. 41 do CPP, não havendo inépcia da inicial.

 

Quanto à denúncia, o ministro destacou que ela foi fundamentada pela colaboração premiada e outros elementos probatórios. "Há a presença de justa causa para o recebimento da denúncia porque a delação foi corroborada por outros elementos," afirmou. Para o ministro, a justa causa está presente a partir da tipicidade, punibilidade e viabilidade da ação penal, indicando a legitimidade da imputação do MP.

 

Moraes enfatizou que, além da detalhada narrativa feita pelo colaborador Ronnie Lessa, há outros indícios e provas trazidos pela Polícia Federal, como referências à organização criminosa, a relação entre os irmãos Brazão e Macalé, e imputações feitas pelo delator que coincidem com a produção probatória exposta na conclusão da CPI das Milícias da ALERJ, provada em denúncias e sentenças de milicianos condenados.

 

Em relação à organização criminosa, o Ministro elencou, em seu voto, dez documentos com indícios necessários para corroborar elementos da delação, e em relação aos homicídios, há 17 tópicos que sustentam a denúncia do MP.

 

*Migalhas

 

 

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