Trabalhador foi discriminado por usar tranças.(Imagem: Arquivo Pessoal)
A 1ª turma do TRT da 3ª região reverteu sentença e condenou uma empresa ao pagamento de danos morais por discriminar trabalhador que usava tranças. Além disso, o funcionário conseguiu a rescisão indireta do contrato. O colegiado considerou que a postura do empregador violou a dignidade da pessoa humana.
Um trabalhador foi à Justiça pedir o reconhecimento de rescisão indireta do contrato de trabalho com pagamento das verbas rescisórias e indenização por danos morais, após deixar emprego por racismo e discriminações sofridas.
O repositor, que trabalhou de março a dezembro de 2021 em um sacolão, alega que precisou deixar o trabalho por se tratar de ambiente hostil, em razão do tratamento que recebia do dono do estabelecimento, que lhe dirigia palavras discriminatórias, vexatórias, racistas e homofóbicas.
Segundo o trabalhador, o chefe determinou aos demais funcionários que o mandassem retirar as tranças do cabelo, novo visual que havia adotado, e que após recusar, recebeu áudios pelo telefone com ofensas e palavras de baixo calão, também racistas e discriminatórias do superior. Diante das circunstâncias, não compareceu mais ao trabalho.
O dono do estabelecimento, por sua vez, negou as acusações e afirmou que a exigência para não uso das tranças pelo empregado se deu em cumprimento aos protocolos de higiene no estabelecimento de venda de produtos alimentícios. Sustenta que o funcionário abandonou o trabalho, deixando de comparecer de forma injustificada.
O trabalhador apresentou áudios de WhatsApp como provas, contendo agressões verbais de cunho racista e homofóbico, acompanhadas de palavras de baixo calão e ameaças sobre a condição de superioridade do emissor em detrimento do ofendido. Segundo os autos, nos áudios, há comparação pejorativa entre uso de tranças no cabelo e o termo "macumbeiro", e entre a não identificação com o gênero masculino na expressão "vira homem" ou "isso não é coisa de homem".
Em 1ª instância o pedido autoral foi julgado improcedente. Desta decisão ele interpôs recurso ao TRT-3.
Dignidade da pessoa humana
O relator da apelação, desembargador Emerson José Alves Lage, citou parecer do MPT e concluiu que a "mensagem gravada nos áudios, irrefutavelmente, viola a dignidade da pessoa humana, não se tratando em nenhum trecho de livre exercício de expressão ou de exercício legal de um direito e, por isso, não encontra qualquer respaldo jurídico".
"Vislumbra-se que o réu, ao buscar impor um padrão de corte de cabelo para seu empregado, sem que, comprovadamente, esteja colocando em risco condições especiais de segurança, mesmo porque não se demonstrou que todos os funcionários, inclusive mulheres, trabalhem apenas de cabelos presos ou usem toucas, age em total desconformidade com os ditames dos princípios da não discriminação e da dignidade da pessoa humana (art. 1º, inc. III), previstos na Carta Maior e nas normas internacionais que o Brasil é signatário. No caso dos autos, restou comprovada a postura do recorrido em obrigar o empregado a retirar as tranças como condição para permanência na loja, comportamento que merece ser coibido."
Com efeito, o colegiado acompanhou o relator para impor indenização por danos morais no valor de R$ 15 mil, bem como para declarar a rescisão indireta do contrato de trabalho e, por consequência, acrescer à condenação o aviso prévio indenizado (30 dias) e a fração correspondente (1/12) sobre as férias mais 1/3, 13º salário proporcional e os 40% rescisórios do FGTS, devendo a reclamada, no prazo de dez dias após intimada para cumprir a obrigação, fornecer a chave de conectividade para saque dos depósitos do FGTS.
O advogado Lucas Valadão Santos atuou no caso.
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