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geral Sexta-feira, 21 de Junho de 2019, 06:06 - A | A

Sexta-feira, 21 de Junho de 2019, 06h:06 - A | A

Câncer e malformação

Alto uso de agrotóxicos em MT pode ser a causa de casos de câncer e malformação

Luana Rocha

As regiões Central e Sul do Mato Grosso, que inclui Lucas do Rio Verde, apresentaram uma maior incidência de leucemias e linfomas segundo pesquisa coordenada pela Universidade Federal do Mato Grosso, a UFMT.

Nesses locais, o estudo aponta que entre os 20 agrotóxicos mais utilizados estão o glifosato e a atrazina. O mesmo levantamento observa que há maior quantidade de pessoas de regiões com alta produção agrícola entre os pacientes internados com câncer infanto-juvenil no Hospital de Câncer de Mato Grosso.

O menino Kalebi Luenzo tinha pouco mais de dois anos quando, de repente, começou a andar com dificuldade. Preocupada, Elisângela, sua mãe, levou a criança ao médico: ele tinha leucemia. Kalebi cresceu próximo a uma plantação de algodão, em Lucas do Rio Verde.

O mecânico de tratores Antonio Correa mudou-se para Tangará da Serra em busca de oportunidade de emprego no crescente setor agropecuário mato-grossense. Depois de dois anos trabalhando em fazendas de soja, teve sua primeira filha, Emanuelly, que nasceu com espinha bífida – tipo de malformação congênita que provoca problemas motores e compromete o funcionamento da bexiga e do intestino.

Giovana Carvalho trabalhava como coordenadora do Centro de Referência de Saúde do Trabalhador de Sinop, também no Mato Grosso, quando começou a sentir dores na região da lombar e nas costas. Cerca de um mês depois, descobriu um tipo raro de câncer no pulmão: que acomete mulheres não fumantes entre 30 e 39 anos.

Essas famílias estiveram expostas a diferentes pesticidas, incluindo o glifosato e a atrazina. Embora estejam entre os mais consumidos no país, essas substâncias estão associadas ao desenvolvimento de câncer e à malformação fetal por pesquisas no Brasil e no mundo.

Uma taxa mais alta de malformação foi encontrada em regiões com maior uso de agrotóxicos como a atrazina, segundo análise publicada em artigo da Universidade Federal do Paraná. O herbicida está proibido desde 2004 pela União Europeia, que associa a substância à ocorrência de distúrbios endócrinos, problema que afeta o sistema hormonal.

Já o glifosato, classificado como “provável cancerígeno” pela International Agency for Research on Cancer, está em meio a intenso debate internacional sobre seus efeitos negativos à saúde. Em março, um júri nos Estados Unidos o apontou como um “fator importante” na relação com o desenvolvimento do câncer em um homem de 70 anos.

Embora não seja possível concluir que os casos encontrados estejam relacionados a esses agrotóxicos, há diversos pontos que ligam as histórias de Kalebi, Emanuelly e Giovana a uma das grandes questões colocadas por médicos e pesquisadores de todo o mundo: estariam os agrotóxicos silenciosamente contribuindo para o desenvolvimento de algumas das piores enfermidades enfrentadas pela nossa geração?

Mesmo com a variedade de estudos sobre os riscos que os agrotóxicos representam à saúde humana, especialistas alertam que as políticas públicas ainda não mudaram de acordo com essas evidências. Em alguns casos, as mudanças parecem acontecer na direção oposta.

Reprodução

Alto uso de agrotóxicos em MT pode ser a causa de casos de câncer e malformação

Alto uso de agrotóxicos em MT pode ser a causa de casos de câncer e malformação

Em Mato Grosso, decreto de 2013 reduziu as distâncias permitidas para aplicação terrestre de agrotóxicos. Ou seja, hoje é permitido aplicar ainda mais perto de povoados, cidades e cursos d´águas. A distância mínima autorizada era de no 200 metros no estado, e em 2013 foi reduzida para 90. Outras mudanças implementadas no mesmo ano reduziram a transparência sobre o uso das substâncias. O Indea, órgão estadual que antes publicava as substâncias e as quantidades de agrotóxicos utilizadas em cada município, hoje não divulga mais esse monitoramento.

Entre os críticos dos agrotóxicos, alguns defendem que as políticas só vão mudar quando mais estudos forem feitos. “É preciso de mais pesquisas científicas para conseguir encontrar essa prova definitiva da relação dos agrotóxicos com doenças como câncer e malformação congênita”, afirma João de Deus, biólogo e especialista em segurança do trabalho do Ministério da Saúde, que atualmente mora em Sinop. “Mas, quando se corta recursos para a ciência, fica cada vez mais complicado provar”. Ele se refere ao corte, feito no ano passado pelo governo Michel Temer, de R$400 milhões no orçamento do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPQ).

Outros pesquisadores entendem que os estudos existentes são o suficiente para mudanças nas políticas públicas, como ocorreu na União Europeia, que proibiu a atrazina e hoje debate a possível proibição do glifosato. “As evidências científicas disponíveis em nível mundial e nacional são concretas, já nos auxiliam no processo de transição para novos modos de produção e de minimização dos efeitos nocivos dos agrotóxicos na saúde humana”, afirma a pesquisadora da UFMT e enfermeira especialista em enfermagem obstétrica, Mariana Soares. “Porém os interesses políticos e econômicos do Brasil passam por cima de quaisquer estudos”

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