Recentemente, foi noticiado um caso emblemático em que a Justiça do Trabalho considerou ilícitas as provas obtidas através de gravações e prints por meio de aplicativo próprio da empresa. O processo tramitou junto ao Tribunal Regional do Trabalho de Minas Gerais da 3ª Região.
Dito isso, surgem algumas dúvidas e inquietações quanto ao tema, afinal, é possível se utilizar de uma gravação ou de prints de uma conversa como meios provas na Justiça do Trabalho? E, mais, tais meios de provas são considerados válidos? Existe, ao final, algum método específico para que este tipo de evidência seja considerado válido dentro no processo judicial?
Com efeito, dentre os princípios probatórios que norteiam o Direito Processual do Trabalho tem-se o princípio da proibição da prova obtida ilicitamente. Nesse sentido, oportunos são os ensinamentos do Professor Carlos Henrique Bezerra Leite:
"As partes têm o dever de agir com lealdade em todos os atos processuais, mormente na produção da prova. O princípio da licitude da prova encontra residência no art. 5º, LVI, da CF, segundo o qual 'são inadmissíveis, no processo, as provas obtidas por meios ilícitos'.
(...). É factível afirmar que a prova ilícita é aquela que implica violação de norma do direito material, uma vez que é obtida por meio de ato ilícito. Já as provas que decorrem de violação de norma processual são chamadas de ilegítimas.
O princípio da proibição da prova ilícita vem sendo mitigado, em casos concretos, com base nos princípios da proporcionalidade (ou da razoabilidade), segundo o qual não se deve chegar ao extremo de negar a validade a toda e qualquer prova obtida por meio ilícitos, como por exemplo, uma gravação sub-reptícia utilizada por empregada que deseja fazer prova de que fora vítima de assédio sexual pelo seu empregador ou superior hierárquico, sem o conhecimento deste".
Do ponto de vista normativo no Brasil, a Constituição Federal (CF), em seu artigo 5º, inciso LVI, veda a utilização de provas alcançadas por meio ilícito. Ainda, o inciso XII do mesmo dispositivo legal garante o sigilo das comunicações telefônicas, salvo na hipótese de determinação judicial. Frise-se que o referido inciso foi devidamente regulamentado pela Lei nº 9.296/96.
Lado outro, o artigo 369 do Código de Processo Civil (CPC) proporciona as partes o direito de ampla produção das provas, por meios legais e legítimos, para a comprovação de suas alegações.
No caso concreto que motivou este breve estudo, os desembargadores da 10ª Turma do TRT-MG entenderam que as gravações e prints da conversa por meio de aplicativo de rede social da própria empresa seriam ilícitas, diante do seu caráter privado.
Em seu voto, a relatora fez a distinção entre interceptação telefônica, escuta telefônica e gravação clandestina, sendo ponderada a licitude da gravação realizada clandestinamente. Aliás, um dos fundamentos para não admitir a prova foi de que as mensagens entre os colegas de trabalho seriam privadas, e, portanto, protegidas pela Carta Magna.
Se é verdade que para a realização da interceptação e escuta telefônicas se faz necessária a autorização judicial, de forma diferente, na gravação clandestina, não há essa exigência, podendo ocorrer a gravação por um dos interlocutores, ainda que sem o consentimento do outro.
Nesta perspectiva, o Tribunal Superior do Trabalho (TST) já emitiu juízo de valor quanto ao tema, concluindo pela licitude da gravação, desde que não haja causa legal de sigilo ou de reserva de conversação.
De igual sorte, este é o entendimento do Supremo Tribunal Federal (STF), conforme se extrai de voto de relatoria da ministra Rosa Weber:
"PENAL E PROCESSUAL PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. DENÚNCIA ANÔNIMA. DILIGÊNCIAS PRELIMINARES. GRAVAÇÃO AMBIENTAL POR INTERLOCUTOR. AUTORIZAÇÃO JUDICIAL. DESNECESSIDADE. VOLUNTARIEDADE E ESPONTANEIDADE. DISTINÇÃO. REVOLVIMENTO FÁTICO PROBATÓRIO. INVIABILIDADE. (...). 3. No Recurso Extraordinário com Repercussão Geral nº 583.937 a Corte firmou a tese de que: 'É lícita a prova consistente em gravação ambiental realizada por um dos interlocutores sem conhecimento do outro', guiada pela premissa de que 'quem revela conversa da qual foi partícipe, como emissor ou receptor, não intercepta, apenas dispõe do que também é seu e, portanto, não subtrai, como se fora terceiro, o sigilo à comunicação (...)'".
Indubitavelmente, os aplicativos de mensagens, em especial o WhatsApp, já se tornaram ferramentas indispensáveis de comunicação entre empregados e empregadores. Acontece que nosso ordenamento jurídico não possui disposição expressa de proibição à utilização dos prints como meios de provas, muito embora existam decisões que não o reconhecem.
Nesse panorama, a 6ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) já se pronunciou pela invalidação da prova obtida pelo espelhamento de conversas via Whatsapp Web, diante da falta de autenticidade das imagens capturadas. Isto porque os prints, analisados de forma isolada, poderiam deixar de apontar eventual exclusão das mensagens enviadas ou recebidas, o que justificaria a fragilidade deste tipo de prova.
De toda sorte, com fulcro no artigo 422 do Código de Processo Civil (CPC), não há dúvidas que os prints possam ser considerados provas válidas, principalmente se o seu conteúdo não for impugnado. Por isso, para uma maior garantia e segurança da informação, é imprescindível que sejam anexados também ao processo judicial os metadados técnicos para garantir a credibilidade e integralidade do seu conteúdo.
Em arremate, impende destacar que não existe prova absoluta, de modo que tanto a gravação telefônica quanto os prints de conversas devem ser analisados e sopesados com demais elementos probatórios, notadamente para que seja construído um conjunto probatório válido.
*Ricardo Calcini é professor e Coordenador Editorial Trabalhista.
*Leandro Bocchi de Moraes é pesquisador e professor.*
Originalmente publicado no site ConJur.
Nossas notícias em primeira mão para você! Link do grupo MIDIA HOJE: WHATSAPP