A chuva que surpreendeu a cidade no dia do seu aniversário mudou o ritmo das pessoas, os sons, os humores.
Observei tudo do 20º andar do prédio onde moro.
As águas foram tão intensas que não respeitaram o meu jardim, guiando as fortes correntezas para a parte inferior da cobertura. Os ralos, embora desobstruídos, mostraram-se passivos, impotentes para impedir o avanço das águas em direção às salas de visita e de jantar.
E assisti a tudo em companhia das cuidadoras.
Pela janela da sala, o cenário era dos piores: ruas transformadas em rios, o desespero estampado no rosto de quem passava.
Carros e ônibus paralisados pela enxurrada, alterando o ritmo da cidade, os sons, os humores.
Dos quatro cantos os celulares enviavam vídeos da tragédia que se abatia sobre Cuiabá.
Centenas de desabrigados buscavam refúgio sob marquises esquecidas.
As sirenes das ambulâncias e do Corpo de Bombeiros rasgavam o silêncio da cidade prestando socorro aos mais necessitados.
As notícias dos bairros periféricos nos revelavam o caos: no Shopping Popular teto e paredes desabaram, causando enormes prejuízos aos comerciantes.
A natureza e a cidade choravam embaladas pela mesma dor.
O local destinado às festividades do aniversário de Cuiabá foi transformado num centro de mutirão para a recuperação da cidade.
Todos sabem que esta capital, com mais de 650 mil habitantes, ainda não tem um plano diretor
‘Uma cidade que se asfixia no calor, transborda na chuva e abandona o básico —o verde.
Rede de esgoto insuficiente. Bocas de lobo entupidas.
Por erros do passado, nossa cidade virou um deserto de concreto mal planejado.
‘Uma cidade que se asfixia no calor, transborda na chuva e abandona o básico —o verde.
Estamos vivendo uma crise climática real.
Ela não vai embora sozinha. Vai piorar.
A culpa é do modelo de cidade que alimentamos há décadas: valoriza-se o asfalto, a obra rápida, enquanto se esquecem as árvores, as áreas permeáveis, a drenagem natural, a justiça ambiental.
A cidade precisa parar de fingir que está tudo bem.
Cuiabá precisa acordar’.
*Gabriel Novis Neves
10-04-2025
https://bar-do-bugre.blogspot.com/2025/04/a-ultima-chuva.html
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