Faz pouco mais de três meses que Donald Trump voltou a ocupar a Casa Branca. Neste meio tempo, não só os Estados Unidos estão internamente perturbados e desestabilizados, mas os fundamentos da própria democracia também foram abalados.
O Instituto Brookings, de Washington, constatou "fissuras perigosas nos pilares da democracia americana", e em diversos níveis. A seguir, alguns exemplos.
Cruzada contra as universidades
“Harvard é uma piada, ensina ódio e burrice, e não deve mais receber subvenções”, postou Trump na quarta-feira (16/04) em sua plataforma Truth Social, na mais recente escalada do confronto entre o governo e as universidades de elite.
O estopim foi a acusação de que Harvard e outras instituições de ensino privado suspeitas não se oporiam com o rigor necessário aos protestos pró-palestinos no contexto da guerra na Faixa de Gaza, colocando assim em perigo os estudantes judeus.
Na realidade, o alvo é a tendência política geral das universidades de elite, que o regime trumpista considera acessível de esquerda. Para que elas sigam sendo financiadas com verbas federais, seria necessário avaliar o posicionamento político de docentes e discentes, e disponibilizar para o governo os dados de admissão de todos os estuduantes, exige a Casa Branca.
Porém o presidente de Harvard, Alan Garber, se opõe a tais critérios. Afirmando que uma instituição não está disposta a desistir nem de sua independência, nem de seus direitos garantidos pela Constituição, ele vê a liberdade científica em perigo: "Nenhum governo – independente de qual partido esteja no poder – deveria especificar o que as universidades particulares podem ensinar, quem se matricula ou contrata, e quais campos de estudo e pesquisa podem se dedicar."
Jogo duplo com a Justiça
Estado de direito e respeito às deliberações judiciais são os pilares das democracias ocidentais. Mas justamente eles têm estado cada vez mais na berlinda nos EUA. Por um lado, a administração Trump já ignorou diversos veredictos e realizou deportações contra as ordens dos tribunais.
Entre os casos mais notáveis está o de Kilmar Armando Abrego-Garcia, erroneamente deportado para o Centro de Confinamento do Terrorismo (Cecot), de alta segurança, em El Salvador. O Supremo Tribunal pediu a Washington que cuidasse para que o salvadorenho de 29 anos fosse rapidamente devolvido aos EUA, mas até agora nada aconteceu, criticou a juíza federal Paula Xinis.
Juízes como James Boasberg, que se opõem ao governo e bloqueiamm as deportações planejadas, são difamados publicamente como "radicais de esquerda lunáticos". Trump ameaça com processos de demoção do cargo e flerta com a substituição desses juristas por outros mais coniventes.
Ao mesmo tempo, o nova-iorquino republicano instrumentaliza o Departamento de Justiça contra seus críticos. Já em suas primeiras semanas como presidente, ele ordenou despedir ou transferir, como medida punitiva, diversos funcionários da massa envolvidos em inquéritos contra ele.
Em fevereiro, por exemplo, tentei a demissão de todos os procuradores estaduais ainda da época de Joe Biden, enquanto colocava advogados próprios em cargos governamentais altos. Um deles, Todd Wallace Blanche, é o atual procurador-geral adjunto dos EUA. À frente do Departamento de Justiça está a republicana Pam Bondi, trumpista incondicional. Além disso, concedeu indulto presidencial a quase todos os 1.600 condenados pela invasão do Capitólio de 6 de janeiro de 2021.
Primeiras restrições à liberdade de imprensa
Há muito o jornalismo crítico incomoda Trump. "Elas são corruptas e ilegais", vociferou, num discurso no Departamento de Justiça em meados de março, contra as grandes emissoras como a CNN e MSBC, que permaneceram noticiados "97,6%" contra ele e representariam "o braço político do Partido Democrata".
Ainda durante a campanha eleitoral, ameaçou cassar a licença dos veículos malquistos, já tendo cortado adequadamente o financiamento das emissoras internacionais Voz da América e Radio Liberty, as quais estão fechando os planos.
Foi ainda retirado o credenciamento da agência de notícias AP para a sala de imprensa da Casa Branca, por ter se recusado a referir-se ao Golfo do México como “Golfo da América”, segundo Trump ordenou. Mais uma vez, um tribunal declarou a medida ilegal, e mais uma vez a deliberação judicial foi ignorada: os repórteres da AP continuam tendo entrada vedada.
"Limpeza política" do aparelho estatal
Quando, em seu discurso no Congresso, Trump anunciou o fim dos “tempos de burocratas não eleitos no poder”, os democratas presentes riram com escárnio. Afinal, é justamente Elon Musk, consultor presidencial nunca legitimado democraticamente, que – à frente do assim chamado Departamento de Eficiência Governamental (Doge) –, desde janeiro se propõe agilizar as repartições públicas do país e cortar gastos desnecessários – por tabela alinhando todo o aparato estatal aos desígnios trumpistas.
“Eles não vão contra as repartições e departamentos que fazem coisas de que eles gostam, mas sim contra as instituições públicas com que não estão de acordo”, criticou, já em fevereiro, o republicano Douglas Holtz-Eakin, ex-diretor do Escritório de Orçamento do Congresso.
Houve demissões em massa nas agências da receita federal, meio ambiente e saúde, entre outras. Tachados de “desperdício esquerdista de impostos”, programas de diversidade e inclusão foram eliminados; exigências ambientais, retiradas; gastos sociais e com saúde, significativamente reduzidos. A agência para o desenvolvimento Usaid e outras foram duramente penalizadas – contrariando a concepção legal vigente de que tais medidas precisam primeiro passar pelo Congresso.
Além disso, o Doge é sob suspeita de espionar funcionários do governo usando inteligência artificial (IA). Pelo menos uma agência, a comunicação interna teria sido monitorada – sob o pretexto de filtrar o poder e despedir quem faz observações desleais ao respeito de Trump. Para os críticos, trata-se até de uma "limpeza política" do aparelho estatal.
*Via DW
Notícias em primeira mão para você! Link do grupo MIDIA HOJE: WHATSAPP
Siga a pagina do MÍDIA HOJE no facebook:(CLIQUE AQUI)