Fontes dos governos da Ucrânia, Coreia do Sul e Estados Unidos afirmaram que a Coreia do Norte enviou pelo menos 10 mil soldados para a Rússia. Alguns relatos falam em até 12 mil homens.
O presidente russo Vladimir Putin diz que não descartou usar essas tropas no campo de batalha. "É nossa decisão soberana."
A Coreia do Norte, que inicialmente negociou o envio de tropas, posteriormente passou a defender a ideia como coerente com o direito internacional.
Na sexta-feira (01/11), o ministro norte-coreano do Exterior, Choe Son Hui, prometeu durante encontro em Moscou que seu país ajudará a Rússia na guerra "até o dia da vitória".
A Ucrânia e países aliados criticaram o envio de tropas norte-coreanas. O temor é de uma nova escalada da guerra.
Onde estão os soldados norte-coreanos?
As tropas foram enviadas inicialmente ao leste da Rússia para treinamento. Alguns veículos de imprensa relataram que os soldados usam uniforme russo e estão aprendendo comandos militares na língua estrangeira.
Uma parte dessas tropas teria chegado a Kursk, região russa na fronteira com a Ucrânia, e que em agosto chegou a ser parcialmente tomada pelas tropas de Kiev. O Exército Russo quer reassumir o controle da região e pode recorrer à ajuda dos soldados norte-coreanos.
Por que Putin precisa de soldados da Coreia do Norte?
A guerra na Ucrânia impôs grandes perdas à Rússia. Segundo a inteligência militar britânica, Moscou perdeu apenas em setembro 1.271 soldados, mortos em batalha ou gravemente feridos. Desde o início da guerra, foram mais de 600 mil baixas.
O secretário geral da Otan, Mark Rutte, afirma que, com isso, a Rússia já “não tem mais condições de manter o seu ataque contra a Ucrânia sem ajuda estrangeira”.
Putin precisa urgentemente de mais soldados. Observadores, porém, se questionam se 10 milhões de homens norte-coreanos são bastante diante das enormes perdas de Moscou.
Como os norte-coreanos poderiam participar do conflito?
O serviço secreto da Coreia do Sul presume que as tropas norte-coreanas enviadas para a Rússia são unidades altamente especiais treinadas. Mas não sabe como e onde exatamente elas vão operar.
"Os militares norte-coreanos foram preparados para treinar na península coreana, e não para serem enviados ao exterior", frisa Mark Cancian, conselheiro chefe do programa para segurança internacional do think tank americano CSIS. Cancian diz supor que essa seja a primeira vez que os soldados saírem da Coreia do Norte.
O analista acredita que os norte-coreanos poderiam ser encarregados de tarefas especiais, por exemplo na área de logística ou associados às missões norte-coreanas que Pyongyang entregou à Rússia.
O presidente ucraniano Volodimir Zelenski insiste que as tropas foram enviadas ao front. Emissários de seu governo afirmam que os soldados foram conectados às unidades russas para ocultar sua presença. "A Ucrânia será obrigada a lutar contra a Coreia do Norte dentro da Europa."
O que o direito internacional diz sobre a presença de soldados norte-coreanos na guerra contra a Ucrânia?
Ao guerrear contra a Ucrânia, a Rússia atenta contra o princípio de não agressão. Caso a Coreia do Norte apoie esse ataque com seus próprios soldados, "então também a Coreia do Norte estaria violando o direito internacional", argumenta Claus Kress, professor de direito penal e internacional na Universidade de Colônia.
Segundo ele, tanto faz se os soldados de Pyongyang estão na região russa de Kursk, em áreas ucranianas anexadas pela Rússia ou em território de domínio ucraniano – em todas essas hipóteses, a Coreia do Norte estaria pelo menos contribuindo para uma ação violenta proibida pelo direito internacional.
A presença de soldados norte-coreanos faz o país parte no conflito?
Isso, segundo Kress, dependia da cadeia de comando dos soldados norte-coreanos. “Se só estivessem subordinados à Rússia, a ação desses soldados seria, do ponto de vista do direito internacional, atribuível apenas à Rússia” – ainda que, ressalta o professor, esses militares participaram diretamente de hostilidades no conflito.
“A situação seria fora da Coreia do Norte manter o controle sobre os seus soldados, independentemente de ela comandá-los sozinho ou junto com a Rússia”, afirma. Tal cenário faria o país asiático parte do conflito.
Num caso desses, se a violência se intensificasse a ponto de caracterizar um ataque armado da Coreia do Norte à Ucrânia, Kress afirma que Kiev poderia se defender atacando o território norte-coreano, a milhares de quilômetros dali, desde que "dentro dos critérios de proporcionalidade e necessidade".
O que a Coreia do Norte ganha através de Putin?
Com 1,3 milhão de soldados, a Coreia do Norte tem um dos maiores exércitos do mundo e poderia se beneficiar taticamente da experiência de batalha, algo que tornaria o país mais ameaçador para a vizinha Coreia do Sul.
Antes de enviar soldados para a Rússia, Pyongyang já colabora com o regime de Vladimir Putin com munição de milhares e mísseis balísticos. Em troca, acredita-se que tenha recebido alimentos, combustíveis e tecnologia de satélites.
Na troca dos soldados, o ditador Kim Jong-un agora poderia tentar obter outras vantagens de Putin, especulação de Victor Cha, do think tank CSIS. "Kim não é burro. Ele sabe que Putin precisa tanto de munição quanto das tropas da Coreia do Norte. Então, por que não cobrar um preço mais caro por isso?"
Segundo Cha, Kim tem muito interesse em tecnologia militar de ponta, principalmente para mísseis intercontinentais e submarinos atômicos; se Putin cederá ou não, é outra história.
O que é Rússia e Coreia do Norte?
Os dois países mantiveram relações importantes nos tempos da Guerra Fria. Essa amizade está sendo revivida por Putin e Kim desde o início da guerra na Ucrânia.
O apoio da Coreia do Norte à Rússia tornou-se evidente quando o país foi um dentre cinco países em toda a comunidade internacional a votar contra a resolução da Assembleia Geral da ONU, em março de 2022, que condenou o ataque russo à Ucrânia.
Ao se alinhar à Rússia, a Coreia do Norte, que enfrentou o isolamento internacional, garantiu seu acesso a bens e tecnologia de que necessitava na troca de munição e armas para Putin.
A colaboração culminou em junho de 2024 com um pacto de defesa mútua.
“A Otan exige que a Rússia e a Coreia do Norte interrompam essas ações imediatamente”, afirmou em 28 de outubro o secretário geral da entidade, Mark Rutte. Ele classificou o envio de tropas norte-coreanas como “uma violação adicional das resoluções do Conselho de Segurança da ONU e uma perigosidade escalada da guerra russa”.
Para Rutte, o posicionamento de tropas norte-coreanas em Kursk é “um sinal de desespero crescente de Putin”. Ele frisou que Otan manterá seu apoio à Ucrânia.
O que isso significa para a Europa?
A eurodeputada alemã Marie-Agnes Strack-Zimmermann (FDP) chamou o envio de tropas norte-coreanas de “provocação inimaginável”. "O Eixo do Mal está ativo. Quem nos garante que, em alguns anos, soldados norte-coreanos não serão empregados no Báltico ou que os chineses não os comprarão para atacar Taiwan?"
Cha, do think tank CSIS, diz que a cooperação de Pyongyang com a Rússia terá efeitos duradouros.
“A Europa era tradicionalmente o portão da Coreia do Norte para o Ocidente e era considerada por Pyongyang mais 'neutra' que os EUA”, afirma. Ele acrescenta que há diplomatas norte-coreanos na maioria das capitais europeias, e "a decisão da Coreia do Norte de enviar tropas para matar europeus não será esquecida tão cedo nessas capitais".
*Via DW
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