A terra fumegante sob o sol do nordeste do Mato Grosso conta a história dos homens que nela vivem. Hoje impera a soja, mas ali já reinou o gado. Antes deles, havia a mata. A entrada das grandes fazendas nos anos 70 marcou a derrubada da Floresta Amazônica e do Cerrado. Essa história é a da vida do técnico agrícola da Rancho 60 Uri Correia, de 40 anos.
— Aqui era Amazônia, tinha árvores que dois ou três homens não abraçavam, ipês imensos. Elas alimentavam as serrarias, tinha muitas delas também. A mata era escura, fechada. Era linda de ver. Derrubamos tudo, era assim que se pensava — diz ele.
Hoje Correia se orgulha de trabalhar com a restauração da mesma floresta que ajudou a varrer do mapa:
— O conhecimento avançou, sei que precisamos da floresta. Tenho uma satisfação muito grande de hoje plantar florestas. É o que faço aqui e na terra que tenho. É o que ensino para a minha filha — afirma.
PROJETO QUER RESTAURAR PARTE DA FLORESTA AMAZÔNICA COM TÉCNICA TRADICIONAL DE PLANTIO

— Nós produtores não somos bandidos. Mas ainda há um trabalho a fazer para levar a cultura da restauração para mais gente. O produtor acha que plantar floresta é como soja, que cresce rápido, e em um ou dois anos quer ver resultado. A muvuca leva uns 3 anos para começar a aparecer — destaca ela referindo-se ao método do ISA e da Rede de Sementes do Xingu.
A região é conhecida como a cabeça do Xingu, onde estão as cabeceiras do grande rio. Todas as nascentes estão fora da proteção do Parque Nacional do Xingu e dependem da restauração das APPs das fazendas de soja e gado.
Lá a Amazônia renasce de uma muvuca, nome escolhido para a técnica que combina sementes nativas com as de plantas usadas como adubação verde. A Rede de Sementes do Xingu trabalha com até 220 espécies de sementes entre nativas e aquelas usadas como adubo verde.
Sementes da Amazônia
Cada muvuca reúne cerca de 60 espécies, mas já fizeram até com o dobro disso. A mistura não é aleatória. Se baseia em estudos científicos e conhecimento tradicional para selecionar as espécies e a proporção de cada uma para uma determinada área. O plantio também varia. Pode ser manual ou com o maquinário da agricultura industrial.
As sementes da muvuca condensam o microcosmo da Amazônia humana. Estão lá os coletores, sejam eles índios, agricultores familiares e moradores de cidades. Também estão os produtores rurais, donos da terra. E ONGs, cientistas, engenheiros, agrônomos, técnicos rurais, que se dedicam à sua preservação.
A rede conta atualmente com 568 coletores no Xingu, 60% mulheres. E ajuda a aumentar a representatividade delas em suas comunidades.
— As mulheres por meio da semente ganharam protagonismo. Nas famílias de assentamento e indígenas, elas muitas vezes ficam invisíveis. Com o trabalho na rede, elas trazem renda e reconhecimento para casa — frisa a engenheira florestal Claudia Alves de Araújo, uma das diretoras da rede.
É o caso das mulheres do assentamento agrícola de Nova Conquista, em Bom Jesus do Araguaia, onde há 17 coletores. Líder comunitária, dona Odete Barbosa, de 78 anos, coleta sementes desde 2010.
— Eu vim aqui para essa terra enraizar. Hoje tenho essa alegria de ajudar a plantar a floresta, tenho mais água. A família gosta de me ver coletando, meus filhos e netos participam. Quem gostar, tem que plantar — diz ela.
*A repórter viajou a convite da Conservação Internacional
Notícias em primeira mão para você! Link do grupo MIDIA HOJE: WHATSAPP
Siga a pagina do MÍDIA HOJE no facebook:(CLIQUE AQUI)