Conhecido como o Pai da BR-163, em razão de sua importante participação na abertura da rodovia Cuiabá-Santarém na década de 1970, o militar e político José Meirelles também carregava consigo o reconhecimento por ser um defensor de ideais ligados a espiritualidade, igualdade social e democracia. Em uma página na internet, em 2007, decidiu compartilhar com amigos e admiradores histórias e mensagens de conforto, sempre baseadas no que consistia seu pensamento social, filosófico-espiritual e político.
O ‘Blog do Meirelles - Um espaço para reflexão’ foi recentemente resgatado por um dos netos do ex-prefeito de Cuiabá, o publicitário Muriacy Júnior, responsável também pela criação da página há cerca de 14 anos. Muriacy conta que a instigação e a curiosidade sempre acompanharam seu avô e fizeram com que, mesmo aos 87 anos, surgisse o interesse por dividir na internet um pouco de seus pensamentos e de sua vida.
Tudo começou com pequenos livros impressos em A4 dobradas, encadernadas e entregues às pessoas mais próximas. O material era chamado de ‘mensagens transformadoras’ e trazia passagens sobre otimismo, fé e experiências de vida. Aos poucos, com a ajuda do neto, Meirelles passou a editar suas mensagens no Power Point, programa utilizado para a criação de apresentações gráficas. Tudo era ensinado para o senhor, que pacientemente anotava os tutoriais em um caderno. O material então era compartilhado com uma longa lista de emails.
“Até que um dia ele me chamou para falar sobre a criação de um blog e se não poderia colocar uma versão das mensagens dele em uma página. Na época, nem eu sabia direito como fazer. Mas eu fiz em uma plataforma gratuita, e ainda bem que foi assim porque está disponível até hoje. Eu fiz a programação inicial, fiz um tutorial para ele e ele escreveu no caderninho, como de costume. Lá ele escreveu por cinco anos, até bem próximo de sua morte”, conta o neto.
Fortemente ligado à espiritualidade, Meirelles carregava diversos contrapontos aos estereótipos mais comumente atribuídos a militares. Crítico da demora das forças militares na abertura do regime, o coronel acreditava que a participação do Exército na vida da população deveria também contribuir para aplacar as desigualdades sociais. “Ele tinha vários pensamentos de como o Exército deveria participar da vida da sociedade. Ele tinha um projeto pronto sobre isso. Uma parte trata do Exército trabalhar para a construção de casas populares, por exemplo. Ele tinha muitas ideias, mas que não puderam ser concretizadas quando ele entrou para a política. Inclusive ele se afastou da política muito por conta disso”, conta o neto.
No blog, o militar chegou a compartilhar o sentimento de frustração que associava com sua experiência na política. “Como político, entretanto, não fui compreendido pela classe política, e nem poderia ser. Os tempos não haviam chegado ainda para essas idéias. Houve, entretanto, semeadura, com frutos esparsos e perspectivas promissoras. Afastei-me totalmente da política partidária; faço questão de não ter partido político; continuo, entretanto, a lutar por tudo aquilo em que acredito, muitas dessas idéias, hoje, ainda no campo das utopias, mas que, em médio e longo prazos, se tornarão realidades; luto por um novo paradigma, mudanças na forma de viver e de sentir a vida do brasileiro; mudar a sociedade para mudar a classe política”, publicou ainda em 2007.
Com a morte de José Meirelles em 2012, muitas de suas anotações não foram publicadas. O desejo agora é que sejam reunidas e divulgadas em um projeto ainda abstrato, que possa servir de homenagem ao seu trabalho social, político e ao seu modo de ver a vida.
Coronel José Meirelles
José Meirelles foi prefeito de Cuiabá nos anos 90. Era vice de Dante de Oliveira quando assumiu o Palácio Alencastro para o então chefe do Executivo disputar o Governo do Estado - eleição da qual saiu vitorioso. Ele também comandou o 9º Batalhão de Engenharia de Construção (BEC) do Exército Brasileiro entre 1971 e 1974 e por isso foi peça-chave para a construção da BR-163. Nos três anos em que ficou sob o comando de Meirelles, o 9º Batalhão de Engenharia de Construção abriu dois quilômetros de rodovia por dia, 1.114 quilômetros no total, até a divisa com o Pará.
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