Seja cultivando tomates, feijão, pepino, chuchu, frutos, repolho, couve-flor, alface, chicória, rúcula ou outras hortaliças em geral, uma coisa é fato: o cultivo orgânico e caseiro não para de crescer. A autossuficiência alimentar é uma prática antiga, e os benefícios são inúmeros: vão desde as melhorias na saúde até a economia de gastos no mercado. Recentemente, com a medida de emergência diante da pandemia e a preocupação com a origem dos alimentos, a qualidade do que se ingere é um assunto que vem ganhando cada vez mais atenção no mundo e levantou uma forte tendência: a de plantar em casa o próprio alimento.
Planejar, fazer e cuidar. Esses são os objetivos que o microempreendedor e pós-graduado em Gestão Ambiental Juarez Alves Martins, 60, decidiu ter ao criar o projeto Horta Linda há quatro anos, e o voluntariado “Uma horta em cada porta” há mais de 15 anos. A iniciativa ajuda a fazer hortas em instituições sociais, em comunidades periféricas e nas casas de pessoas em situação de vulnerabilidade.
A agricultura sempre fez parte da vida de Juarez. Nascido em uma pequena comunidade rural no interior de Goiás, ele conta que aprendeu a cuidar de plantas com os pais e avós na roça ou na horta que tinha em seu quintal. “No início dos anos 1980, vim sozinho para Brasília, queria estudar e fixei residência aqui. Era difícil morar na cidade grande, tinha muita saudade, e o cultivo de pequenas hortas nos quintais ou janelas das casas onde morei me ajudou a ‘aguentar’ a vida urbana”, explica.
Juarez fez cursos na Embrapa Hortaliças e na Emater, aprendeu a cuidar melhor de suas plantas. “Os amigos começaram a me pedir dicas de cultivo, e eu ensinava o que sabia. Com o tempo passei a convidar pessoas para me ajudarem a fazer hortas em creches, terrenos baldios, casas de pessoas empobrecidas e isso foi muito legal, porque esses amigos aprendiam técnicas de cultivo ‘na prática’, conheciam a realidade de pessoas muito pobres e ainda faziam uma boa ação”, lembra.
Dessa forma, surgiu o projeto de voluntariado “Uma horta em cada porta”, que já fez inúmeras hortas em escolas, creches, asilos e casas de Ceilândia, Paranoá, Sobradinho II, Fercal, Estrutural, Luziânia e no centro de Brasília. “Cuidar de uma horta, seja ela em um grande quintal ou em uma pequena janela, é um ato maravilhoso que vai muito além da simples produção de alimentos saudáveis, o que já é muito bom. Mas já percebi, nesses anos, que uma horta pode “desembrutecer” as pessoas”, garante Juarez.
Além de melhorar a alimentação e a saúde física, a horta ajuda a manter a saúde mental. “Nesses tempos de pandemia, tenho relatos de pessoas que fazem hortinhas como terapia complementar contra a depressão, por exemplo”, cita o empreendedor. “O ato de plantar, colher e comer, mesmo que em um pequeno espaço, mantém nossa memória acesa, renova nosso vínculo com a terra, com nossa ancestralidade, que é rural”, defende.
Para ajudar aqueles que desejam iniciar o cultivo doméstico, Juarez explica que criou o projeto Horta Linda, onde oferece tutoriais e dicas na internet, além de oficinas gratuitas pela cidade. “Para quem não tem experiência, cultivar uma horta é uma sequência de tentativas, erros e acertos”, explica. O mais importante é começar e não desanimar, conforme defende o empreendedor. “Plante com amor. A terra é generosa com quem semeia com alegria e esperança”, completa.
Resgate
Outros projetos têm apostado nessa ideia e conquistado espaço em Brasília com o intuito de incentivar a prática. É o caso da iniciativa Coma Seu Jardim, que vem resgatar a antiga prática das civilizações e sociedades humanas de cultivar sua própria comida. Nessa proposta, o projeto estimula a ideia da necessidade de alimentos frescos e livres de contaminação por agrotóxicos na mesa das pessoas, de acordo com o segundo objetivo de Desenvolvimento Sustentável da ONU, referente à Agenda 2030: “Acabar com a fome, alcançar a segurança alimentar e melhoria da nutrição e promover a agricultura sustentável”.
Idealizador e executor do projeto, Victor Manuel Lizarraga Teixeira, 55 anos, explica que a iniciativa tem cerca de um ano. A ação começou com pés de alface. “Nós não tínhamos planta alguma, somente 10 pés de alface. A partir de então, começamos a ter uma produção muito grande e não conseguimos consumir. Daí, comecei a fazer escambo, trocar com amigos por bolos, bonecas de pano e coisas que as pessoas produziam”, recorda.
Durante a pandemia, ele diz que muitos estavam perdendo empregos e começou a fazer a distribuição de alguns dos cultivos. Os produtos plantados, na casa do Lago Norte, foram selecionados segundo os hábitos alimentares da família de Victor. Entre os alimentos estão: alface, bertalha, rúcula, salsinha, cebolinha, coentro, pimentão, jiló, pimenta, brócolis, batatas, alho-poró. De acordo com o idealizador, a base do projeto é o escambo e a conscientização das pessoas de que se pode plantar em casa o que vai consumir. “Matéria-prima ocupacional é uma forma de unir as famílias, porque todos ficam envolvidos com as plantas, além de ser uma opção muito saudável de alimentação”, defende.
Além dessa conexão, Victor diz que a saúde da família melhorou consideravelmente. “Eu sou diabético, mas a doença está controlada, devido à alimentação. A minha filha e o meu pai também. Alimentação é tudo e melhora o seu estado de humor, espírito, sua autoestima”, acredita. Além dos nutrientes, o esforço físico da iniciativa também ajuda a saúde. “O ato de plantar no seu quintal, de consumir o que planta, é bom para o espírito, a alma, a cabeça e o físico”, defende. O plano agora é apresentar o projeto para áreas de extensão de universidades federais e introduzir em comunidades atendidas por elas, além de implantar o projeto em casas.
De acordo com Victor, não é preciso área verde para se ter um jardim. “O seu jardim não é feito só para quem tem casa. Nós desenvolvemos uma massa de cimento com isopor, que é descartado, trituramos com isopor, na medida certa, e fazemos vasos e canteiros para que as pessoas possam plantar dentro de casa”, explica. “Algumas brincam dizendo que é um projeto socialista solidário, mas não é um rótulo político, é um rótulo humano”, completa.
Comunidade
Eliminar terrenos baldios em áreas urbanas, produzir e fornecer hortaliças para o consumo de escolas e famílias e melhorar a qualidade da alimentação da comunidade são algumas das vantagens da implantação de hortas comunitárias nas cidades. Desde 2017, a Horta Comunitária do Guará, localizada nos fundos da unidade básica de Saúde Nº 05 na QE 38, no Guará II, tem sido referência para esse tipo de prática.
A iniciativa surgiu pela vontade de um grupo pequeno de voluntários interessados em fazer uma horta para plantar e colher alimentos na comunidade local. “Buscaram apoio do administrador regional à época, para usar o local que se encontrava obsoleto e cheio de lixo e entulho. Assim, limparam o local, fizeram os canteiros e começaram a plantar”, recorda a responsável pelo projeto e engenheira ambiental Dái Ribeiro, 39.
Para manter o funcionamento da horta, são realizados encontros comunitários quinzenalmente, aos sábados pela manhã, das 9h às 12h, com programação de plantio, manutenção de canteiros, lanche comunitário, colheita e distribuição de cestas das hortaliças. As atividades da horta são realizadas pelos voluntários sob a coordenação de 10 líderes, com responsabilidades de responder pelas atividades de mobilização da comunidade.
As cestas de hortaliças são formadas com alface, couve, quiabo, jiló, repolho, rúcula, mandioca, batata-doce, milho, cheiro verde, chuchu e outros itens da época. Cerca de 25 a 30 famílias levam para casa uma cesta de hortaliças no encerramento do encontro. E o excedente é doado para outros projetos sociais. “A importância desse projeto está em garantir alimentação saudável às famílias e, consequentemente, proporcionar qualidade de vida, por meio da atividade de contato com a terra e o lazer proporcionado pela sinergia entre os voluntários”, explica Dái.
A horta é mantida por doações e pelo Instituto Arapoti, mantenedor. Recentemente o instituto conseguiu, pequeno patrocínio de uma empresa, que adotou três canteiros para fornecimento de adubo e, assim, a horta se mantém com doações que ajudam na aquisição de adubos, sementes e mudas. Agora, o intuito é ampliar o projeto para outras cidades do DF. “Mas, para isso, precisa de recursos”, explica Dái.
Dicas para plantio
-
Escolha um local que receba ao menos quatro horas de luz solar por dia e instale ali seu canteiro ou vaso.
-
Faça uma adubação orgânica e plante hortaliças que você goste de comer;
-
As melhores são aquelas que já fazem parte do seu hábito alimentar. Plantas como a rúcula e o rabanete são muito rápidas, elas vão do plantio à colheita em apenas 25 dias. Alfaces e couves poderão ser colhidas em 40 dias, e o que é melhor: todas estas dão pouquíssimo trabalho podem ser cultivadas em vasos, jardineiras e em canteiros.
-
Hortaliças precisam de ao menos quatro horas de luz solar por dia. Pode ser sol matinal ou vespertino.
-
Molhe apenas até começar a escorrer água no fundo do vaso.
Nossas notícias em primeira mão para você! Link do grupo MIDIA HOJE: WHATSAPP